Greice está sendo exibido nos cinemas do IMS Paulista e IMS Poços durante o mês de julho.
A expressão graça abrange diversos significados: humor, elegância, encanto, leveza. Todos esses elementos se aplicam a Greice, um filme luso-brasileiro dirigido pelo cearense Leonardo Mouramateus que chega às telonas nesta semana.
Esses conceitos também se refletem na personagem principal, Greice (Amandyra), uma jovem de Fortaleza que estuda na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Sua vida parece ser governada pelo acaso, ou melhor, pela confiança de que ela conseguirá se virar em qualquer situação, graças ao seu carisma, beleza e astúcia.
Greice vive em Portugal com um visto de estudante, porém trabalha como assistente da cantora e dançarina Clea (Isabél Zuaa, em uma performance marcante que lembra Zezé Motta em Xica da Silva) e administra um quiosque de café no centro de Lisboa. Um incidente em uma festa para calouros da faculdade faz com que Greice perca sua matrícula e, consequentemente, seu visto. Diante disso, ela decide retornar para Fortaleza, talvez em uma fuga, talvez para regularizar sua situação documental.
Abordagem Lúdica
Talvez é uma palavra que permeia essa narrativa, devido à personalidade enigmática de Greice, mas também pela estrutura da história quase como um quebra-cabeça. Não por acaso, o filme começa e termina com uma “caça ao tesouro” realizada na festa dos calouros. O espírito lúdico guia a construção do filme, com saltos temporais, elipses espaciais e sobreposições de diálogos em diversas cenas.
Durante boa parte do tempo, Greice é uma fingidora que inventa pequenas mentiras para escapar de situações difíceis ou obter vantagens. Por exemplo, em pleno calor cearense, ela se agasalha para simular o inverno português durante uma conversa por Skype com a mãe.
Em Greice, há uma pitada de romance picaresco ou comédia de trapaças, como em filmes como Jogo de emoções, Nove rainhas ou Vai trabalhar vagabundo. No entanto, a personagem de Greice não carrega o amoralismo, o cinismo ou a vontade de enganar tão comuns nesse tipo de gênero. Tudo nela parece genuíno e natural. Como Clea declara, “Greice é amiga das circunstâncias; transforma a mentira em verdade e escreve de trás para frente”.
O diretor Leonardo Mouramateus conduz a jornada da protagonista fingidora com leveza e inteligência, revelando momentos de “a dor que realmente sente” quando está sozinha em um quarto de hotel, ouvindo a mãe ao telefone. De maneira significativa, ela retira a máscara cosmética nesses instantes. A cena se desenrola sem música, sem ênfase, terminando com Greice sentada no vaso sanitário. Nada do melodramático.
Equilíbrio e Fluidez
Uma comédia romântica se desenha, com o improvável envolvimento de Greice com Enrique (interpretado pelo cantor cearense Dipas), um funcionário do hotel onde ela se hospeda em Fortaleza. Enrique também é mototaxista, cantor e dançarino nas horas vagas, sendo outro personagem romântico e de bom coração.
Mouramateus evita enquadrar seu filme em um gênero específico, mantendo-o suspenso em um equilíbrio entre várias possibilidades – assim como seus personagens. Isso resulta em uma sensação de liberdade rara no cinema contemporâneo.
Um dos momentos mais marcantes é o plano-sequência em que Enrique ensaia uma coreografia com seus companheiros para um “campeonato de swingueira”. A câmera realiza um movimento de 360 graus sem cortes, acompanhando a ação dos personagens, os diálogos e o ritmo da dança. Um feito incrível que certamente exigiu preparação detalhada, mas que se desenrola na tela de forma natural. Como na poesia de Drummond, “já não sei se é jogo, ou se poesia”.
Além do roteiro inteligente, a fluidez narrativa se deve à montagem precisa de Karen Akerman e ao talento do jovem elenco. Como uma brincadeira para o público, o ator Mauro Soares interpreta dois papéis, o namorado português de Greice e o funcionário do consulado lusitano em Fortaleza, sem que a protagonista perceba a “semelhança”. Da mesma forma, a atriz portuguesa Filipa Matta interpreta de forma lúdica duas funcionárias da Faculdade de Belas Artes que não possuem parentesco.
Temas atuais, como os incêndios florestais agravados pelo aquecimento global e a ascensão da extrema direita no Brasil, são abordados de forma sutil. O espectador mais atento certamente os notará.
Com méritos, Greice conquistou o prêmio de melhor direção no festival IndieLisboa e os prêmios de melhor filme, roteiro e atriz (Amandyra) no Olhar de Cinema, em Curitiba.
https://ims.com.br/blog-do-cinema/greice-por-jose-geraldo-couto/