A década teve um início marcado por uma sensação de fim iminente, uma espécie de apocalipse temporal. Com um olhar atento aos últimos anos, o filme SOAP retrata as mudanças comportamentais desse período histórico recente. Originalmente concebido para o circuito de arte, o filme é apresentado como uma série de seis episódios e meio, que serão exibidos como um longa-metragem na Sessão Cinética de abril.
Idealizado por Tamar Guimarães, o projeto é uma sátira que aborda o cenário político do país sob a perspectiva de um grupo social específico, que se entrelaça com as instituições culturais que o financiam e exibem. Em meio a artistas, intelectuais, ativistas e trabalhadores da cultura com tendências de esquerda e cosmopolitas, surge a história de um grupo de amigos espalhados entre o Brasil e Alemanha durante a pandemia, unidos na tentativa de produzir uma telenovela de infiltração para alcançar o público bolsonarista.
Os episódios do filme revelam as discussões acaloradas sobre o projeto, que parecem destinadas ao fracasso desde o início. No entanto, traçam um retrato da vida de uma comunidade emaranhada em questões políticas e sociais mais amplas. SOAP documenta a ansiedade gerada por uma nova percepção da sociedade, onde as bolhas sociais parecem nos separar.
As conversas entre os personagens revelam o embate de ideias e discursos, em um contexto permeado pela politização de questões cotidianas. O filme questiona a autenticidade das posições defendidas, sugerindo uma crise na política devido à superficialidade dos debates. Contudo, sugere uma reflexão sobre a subjetivação política e a possibilidade de transformação.
Em um momento marcante, o filme aborda a interação entre um historiador e um manifestante durante um protesto nacionalista e cristão na Alemanha. A tensão do diálogo revela a incompreensão mútua e a resistência em ouvir o outro. A sinceridade e a convicção da fala do manifestante destacam a necessidade de se repensar as interações sociais e políticas.
SOAP oferece uma visão crítica e provocativa sobre as dinâmicas sociais e políticas da contemporaneidade, convidando o espectador a refletir sobre o papel das narrativas na construção da identidade e na busca por uma mudança autêntica.