Motel destino está disponível para ser assistido nos cinemas do IMS Poços e IMS Paulista durante o mês de agosto.
Ao assistir Motel Destino, de Karim Aïnouz, é impossível não se impressionar com dois elementos principais: os corpos e as cores. Além da trama envolvente e das questões exploradas a níveis psicológicos e morais, é na interação entre corpos e cores que o filme realmente se destaca.
A história, resumida em seus aspectos essenciais, segue a linha de tantos clássicos da literatura e do cinema noir, especialmente “O destino bate à sua porta”, de James M. Cain, que teve diversas adaptações cinematográficas: um intenso triângulo amoroso entre uma mulher, seu amante mais jovem e seu marido mais velho, culminando em crime.
Neste caso, o terceiro ponto desse triângulo, responsável por trazer desequilíbrio e suspense, é Heraldo (Iago Xavier), um jovem de vinte anos que, fugindo de uma gangue de traficantes, encontra refúgio no motel cujo nome dá título ao filme, de propriedade do casal Dayana (Nataly Rocha) e Elias (Fábio Assunção).
Enfoque sensual
Uma grande novidade em relação ao estilo noir mencionado é o cenário paradisíaco à beira-mar no Ceará, com suas praias, dunas e falésias. Outra novidade é que boa parte da trama se passa dentro de um motel à beira da estrada, que empresta seu nome ao filme.
No entanto, a verdadeira originalidade dessa adaptação tropical de um enredo clássico e universal está na estética: corpos e cores, como já mencionado. A escolha de filmar em película de 16 milímetros, com uma fotografia excepcional de Hélène Louvart, e o uso predominante de cores quentes na direção de arte dão aos personagens e ambientes uma energia quase palpável, intensificada, nas cenas internas, pela iluminação exuberante do motel. É quase um ataque visual, a ponto de um aviso no início do filme alertar para possíveis impactos em espectadores sensíveis.
Além disso, na dinâmica entre os personagens, há um forte enfoque no aspecto físico, sensual, enfatizado pela trilha sonora com suspiros e gemidos no motel e pela presença frequente e simbólica de animais em cena: jumento, cobra, gato, bode, cavalo, pássaro, invadindo por vezes o espaço dos humanos. Em determinado momento, observando uma cena íntima entre jumentos nos arredores do motel, Elias comenta com Heraldo: “Seria bom se a vida fosse apenas isso”. E no ápice dramático, na “hora da verdade”, os personagens estão nus, em meio à noite, no meio do nada, rebaixados à sua natureza animal.
Obviamente, há uma análise da realidade social na qual essas pulsões de vida e morte se manifestam. O poder do dinheiro e das armas restringe a liberdade de movimento dos personagens. Heraldo, um jovem negro e pobre, entende isso melhor do que ninguém. Ao ser questionado por um policial, ele resume: “Eu nasci. Desde então, luto a cada dia para não morrer”.
A lei da atração
No entanto, o que prevalece é a lei da atração. Nesse sentido, a originalidade de Motel Destino em relação ao triângulo clássico do noir está, em minha opinião, na introdução de uma certa ambiguidade sexual, que vai além da insinuação de uma possível atração do marido pelo amante de sua esposa. Desde a primeira cena, na qual dois jovens seminus brincam de lutar entre dunas desertas (antes de sabermos que são irmãos), todas as interações físicas do filme se situam no limiar entre jogo – principalmente de cunho sexual – e agressão.
Todas essas nuances ganham clareza e impacto graças às performances excepcionais do elenco, especialmente de Fábio Assunção, que incorpora nas suas ações, palavras e olhares as contradições do macho dominante brasileiro, simultaneamente brutal e vulnerável, autoritário e inseguro, temeroso da traição de seus próprios desejos.
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