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Crítica| A Primeira Profecia (2024) supera o material original

Claro está que o filme “A Profecia”, dirigido por Richard Donner em 1976, nunca foi considerado uma grande obra do cinema. Apesar de algumas cenas icônicas, uma premissa intrigante (uma criança sendo o próprio diabo) e uma trilha sonora marcante (Ave Satani, que inclusive ganhou um Oscar), o filme original se resume a teorias conspiratórias absurdas e uma narrativa que exige bastante da boa vontade do espectador, que precisa acreditar que um diplomata e um fotógrafo, do nada, se tornam detetives habilidosos ao seguir manchas em fotografias. O filme teve duas sequências que não conseguiram ser memoráveis e um remake em 2006, que chega a ser ridículo ao reproduzir fielmente a história e cenas do original, apenas adaptando as profecias para os anos 2000 (incluindo até as torres gêmeas).

Já em “A Primeira Profecia”, a diretora e roteirista Arkasha Stevenson abandona a superficialidade de “o mar é a política” e traz potência para um filme que aborda questões como a exploração e apropriação do corpo feminino, a violência obstétrica e até mesmo o patriarcado, ambientado em um convento de freiras.

Na trama, uma noviça norte-americana (interpretada por Nell Tiger Free) chega em um convento em Roma para sua cerimônia do véu e começa a ter visões aterrorizantes com Carlita (interpretada por Nicole Sorace), uma garota que vive no local (ou está presa?). Ao mesmo tempo em que descobre detalhes sombrios do convento e das pessoas que ali habitam, ela se depara com uma possível conspiração envolvendo o nascimento do anticristo.

Nell Tiger Free, que já demonstrou sua habilidade em interpretar personagens perturbados na série “Servant”, brilha no papel principal, dividindo os holofotes com a sempre incrível Sônia Braga, que interpreta a Madre Superiora do convento de forma austera e assustadora. É nela que recai a responsabilidade de dar veracidade e um tom sufocante a todas as atrocidades que vão se desenrolando diante dos olhos do espectador.

“A Primeira Profecia” é tenso e bem produzido, mas seu grande mérito está em expor de forma contundente ao espectador incauto – que talvez estivesse esperando apenas um filme cheio de sustos fáceis sobre a origem do diabo – que, mesmo com o passar dos anos, décadas e séculos, o corpo da mulher continua sendo tratado como algo a ser profanado, vasculhado e subjugado, independentemente das motivações, seja para salvar ou destruir o mundo.

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