Aos 37 anos, Novak Djokovic alcançou mais uma grande conquista ao conquistar a medalha de ouro nas Olimpíadas de Paris, completando assim sua coleção de títulos. Surpreendendo muitos, menos Toni Nadal, o lendário técnico de Rafael Nadal já previa esse feito e tantos outros na vitoriosa carreira do sérvio.
Em uma entrevista ao Estadão, Toni compartilhou uma história interessante sobre seu primeiro encontro com Djokovic no circuito, há duas décadas. Na época, ele treinava seu sobrinho, Rafael, de 19 anos, enquanto o sérvio tinha 18. Após observar apenas 10 minutos de jogo de Djokovic, Toni viu nele um talento excepcional, capaz de futuras conquistas que se confirmaram com o tempo. “Rafa, temos um problema”, disse o espanhol na época.
No decorrer da conversa, o espanhol de 63 anos destacou o que chamou sua atenção no jovem tenista sérvio naquela época, insinuou o motivo que pode adiar a aposentadoria de Rafael Nadal, fez projeções sobre a carreira de Carlos Alcaraz, revelou quem ele considera o melhor tenista da história e falou sobre o cenário do tênis brasileiro durante o evento “Brasil em Código”, promovido pela GS1 Brasil, no qual atuou como palestrante.
Confira os principais momentos da entrevista:
A surpresa da medalha de ouro de Djokovic nas Olimpíadas te pegou de surpresa?
Não. O que realmente me surpreende é o fato de Djokovic não estar em sua melhor temporada até agora. No entanto, ele foi muito bem nas Olimpíadas, em minha opinião. O que também me surpreende é a falta de novos tenistas capazes de derrotá-lo. Anteriormente, ele já era muito bom, mas nas Olimpíadas do Rio-2016, por exemplo, ele não esteve em seu melhor. (Juan Martín) Del Potro conseguiu vencê-lo logo no início. Agora (olhando ao redor como se procurasse alguém), antes do início das Olimpíadas, eu já pensava quem conseguiria levar a medalha de ouro. Alcaraz ou Djokovic? Acredito que os outros não teriam chance contra Djokovic. Isso me surpreende um pouco.
Voltando ao passado, quando você ainda treinava Rafa no circuito. Ao ver Djokovic jogar pela primeira vez, você imaginava que ele se tornaria uma lenda do tênis?
Sim. Lembro-me claramente da primeira vez em que o vi jogar. Estávamos em Wimbledon, treinando com Rafa. Após o treino, passei por um jogo de Juan Monaco, grande amigo de Rafa, e perguntei quem era o adversário de Monaco. Fui informado que era um garoto de 18 anos. Na época, Rafa tinha 19. Decidi observar um pouco mais, pois pela idade, ele poderia se tornar um adversário frequente para Rafa. Assisti cerca de 10 minutos do jogo e, ao voltar para o vestiário, me aproximei de Rafael e disse: ‘Rafael, temos um problema!’. Eu já havia visto vários bons jogadores, mas o nosso problema era o Novak Djokovic. Dez minutos de jogo foram o suficiente para perceber que havia algo especial nele.
O que exatamente chamou sua atenção?
Naquela época, ele devia estar por volta do número 120 do mundo e estava jogando contra Monaco, que provavelmente estava no Top 20. Era evidente que Djokovic sempre tinha o timing perfeito, era ágil, não tinha medo da bola. Esse timing fino só é possível para quem possui excelente visão de jogo, compreende profundamente o esporte. Além disso, era notável uma técnica fácil e muita destreza.
Quem você considera o melhor da história?
Para mim, Djokovic. Ele acumulou mais títulos. No entanto, podemos nos questionar: quem é realmente o melhor? Aquele que jogou melhor ou aquele que conquistou mais títulos? Aquele que possui recordes ou aquele que venceu uma Olimpíada? Essas questões são difíceis de responder. Na minha visão, quem jogou o melhor tênis foi Federer. Se Rafa não tivesse sido tão impactado por lesões, talvez pudesse se destacar como o melhor. É uma escolha difícil, mas acredito que podemos afirmar que Djokovic merece o título por ter conquistado mais títulos relevantes e ter permanecido no topo do ranking por mais tempo.
Sabemos que Djokovic é impulsionado pela busca incessante de recordes e marcas históricas. Rafael Nadal ainda busca alcançar algum feito no circuito?
Rafa é um pouco distinto. Ele é um jogador apaixonado por tênis, que ama a competição. Não sei se ele tenta buscar a perfeição em tudo, como Djokovic, para alcançar recordes. Djokovic escolhe sempre a dieta perfeita, segue meticulosamente seu treinamento. Rafa não age dessa forma. Ele ama a adrenalina da competição, mas, assim como Federer, ele possui uma mentalidade diferente. Contudo, é inegável que Djokovic vence não apenas por sua disciplina, mas principalmente por seu talento excepcional.
Você tem conhecimento sobre os planos de aposentadoria de seu sobrinho?
Não tenho certeza. Ele mencionou que não participaria do US Open, mas desconheço os motivos e seus planos futuros. Sei que ele esperava ter uma boa temporada no saibro, porém, por diversos motivos, isso não foi possível se concretizar. Esta é uma das dificuldades em fazer previsões sobre sua aposentadoria, pois ele tinha o desejo de realizar essa última sequência de torneios sem problemas físicos.
Federer e Murray já deixaram as quadras. Rafa e Djokovic são os próximos. Sentiremos falta do famoso Big 4 do tênis masculino?
Não acredito que será assim. A cada ano, surge um novo vencedor em Wimbledon, Roland Garros, US Open e Aberto da Austrália. Sempre há um novo tenista, um novo ícone. É um ciclo infinito. Anteriormente, pensávamos que não haveria substitutos à altura de Messi e Cristiano Ronaldo. No entanto, surgiram outros jogadores, talvez não tão magníficos quanto Messi e Ronaldo, mas novos talentos sempre aparecem. Foi realmente especial ter Nadal, Federer, Djokovic e Murray competindo na mesma época, sendo considerados os três maiores da história e jogando simultaneamente. Não é comum termos três tenistas tão dominantes no mesmo período. Contudo, agora temos Carlos Alcaraz, que mostra grande potencial, assim como Jannik Sinner. Existem novos tenistas, novos ídolos em ascensão.
Até onde Alcaraz pode chegar em sua carreira?
Ele tem potencial para alcançar grandes feitos. Além de ser muito talentoso, Alcaraz possui todas as qualidades necessárias: é veloz, possui um forehand incrível, um backhand sólido, um bom saque e um dropshot eficaz. Ele reúne diversas habilidades. Além disso, ele não terá que enfrentar as versões mais brilhantes de Federer, Nadal e Djokovic. Isso faz toda a diferença, pois Djokovic já não é o mesmo de antes. Em minha opinião, Alcaraz reconhece que, quando entra em quadra e joga bem, ele vence. Talvez isso não seja suficiente contra Sinner. Antigamente, quando Rafa enfrentava Federer, Djokovic ou Murray, mesmo jogando bem, ele não tinha certeza da vitória. Agora, acredito que os adversários são um pouco menos desafiadores.
Você está acompanhando o tênis brasileiro? Já assistiu a alguma partida de João Fonseca?
Sim, presenciei sua atuação no Rio Open. João Fonseca apresenta várias qualidades em seu jogo: possui golpes excepcionais, entende profundamente o esporte e demonstra agressividade em quadra. No entanto, seu futuro dependerá de seu desenvolvimento nos próximos anos. Ele tem o potencial necessário para se tornar um excelente jogador, mas no final das contas, tudo se resume à evolução que ele alcançará nos anos seguintes.
Você encerrou sua carreira como técnico?
Sim, nos últimos anos estive colaborando com o canadense Félix Auger-Aliassime. Foi desafiante para mim me manter envolvido no trabalho. Minha participação era mais como conselheiro do que como treinador. Eu oferecia a ele meu ponto de vista e sugestões, porém ele já possuía um técnico principal. Posteriormente, decidimos seguir caminhos diferentes. Estou um pouco mais velho agora, mais focado nas atividades da Rafa Academy. Recentemente, estive conversando com diversos jovens jogadores que têm potencial para se destacar. Gosto de aconselhar, mas não almejo mais estar envolvido no dia a dia do trabalho técnico.